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terça-feira, 21 de outubro de 2014

Laudo que contesta suicídio da mãe de Bernardo é enviado à Justiça

Do G1 - Um laudo elaborado por um perito particular que contesta a morte de Odilaine Uglione, mãe do menino Bernardo Boldrini, foi enviado nesta segunda-feira (20) à Comarca de Três Passos, no Noroeste do Rio Grande do Sul. O documento aponta que a mãe do menino, morto em abril deste ano, não cometeu suicídio e sim foi assassinada em 2010 dentro da clínica do então marido, Leandro Boldrini. O objetivo é reabrir as investigações.

Segundo o advogado da família, Marlon Taborda, a mesma análise foi anexada na sexta-feira (17) a um recurso protocolado no Tribunal de Justiça, ainda não julgado, pedindo a reabertura do caso. Leandro está preso desde abril e é réu pela morte do menino, achado sem vida am abril deste ano em Frederico Westphalen, Norte Gaúcho. Também são acusados pela morte a madrasta do garoto, Graciele Ugulini, e os irmãos Edelvânia Wirganovicz e Evandro Wirganovicz. Os quatro respondem por homicídio qualificado e ocultação de cadáver.

A mãe de Odilaine, Jussara Uglione, de 73 anos, acredita que a filha não se matou com um tiro de revólver calibre 38, com concluiu a polícia há cerca de quatro anos. A mesma opinião é aferida pelo especialista em ciências policiais Eduardo Llanos, contratado por ela. Ele ajudou a elaborar um novo laudo sobre a morte de Odilaine. Llanos diz não ter "nenhuma dúvida" de que a mãe de Bernardo foi assassinada.

Segundo o advogado da avó de Bernardo, entre julho e agosto, a Comarca de Três Passos já negou dois recursos que buscavam a reabertura do caso. Na época, porém, os pedidos não contavam com os dados novos, apresentados pela análise particular. O defensor ressalta que reviravoltas jurídicas no país já se basearam em perícias particulares, contestando a versão oficial.

"O Judiciário aqui do Rio Grande do Sul ainda não é muito habituado. Mas baseei em outras decisões que levaram em conta" explicou Marlon Taborda ao G1. O material também já está nas mãos do Ministério Público Estadual (MP). "É uma prova pericial nova que indica quase duas dezenas de erros [na análise oficial]. E é importante lembrar: é bem provável que ainda teríamos Bernardo vivo caso a investigação sobre a morte de Odilaine indicasse o assassinato, pois a guarda ficaria com a avó", analisou.

O advogado também encaminhou nesta segunda ao Instituto-Geral de Perícias (IGP) uma petição para a avó ter acesso às provas coletadas na época da morte de Odilaine. De acordo com Taborda, o recurso no TJ deve ser apreciado em um mês. Já na instância de 1º grau, uma eventual decisão de reabertura dependeria de uma solicitação do MP.

Polícia rechaça falhas
Na época da morte de Odilaine, a polícia chegou à conclusão de que se tratava de suicídio com base no depoimento de testemunhas e nos laudos da perícia oficial, mas um resultado intrigou a família da enfermeira. Havia resíduos de chumbo – o principal elemento químico da pólvora – apenas na mão esquerda de Odilaine, mas ela não era canhota. Era destra. “Os amigos desconfiaram primeiro, mas ninguém queria me contar. E pensando no Bê [Bernardo] a gente ficou quieto”, diz Jussara.

A mãe acredita que Odilaine foi assassinada. Ela conta que, cerca de cinco horas antes de morrer, a filha estava feliz, pois iria se separar de Leandro. O motivo: brigas e traição. “Ela me disse: ‘Mãe, o Leandro andava pulando a cerca. Já vi, já peguei’. Cada um ia seguir seu rumo. Ela iria receber R$ 1,5 milhão e mais R$ 8 mil de pensão”, conta Jussara.

Depois de falar com a mãe por telefone, Odilaine foi se encontrar com o marido. A clínica do médico Leandro Boldrini funcionava em um andar de um prédio comercial. Segundo as investigações, Odilaine entrou pela porta que era o acesso dos pacientes e foi direto ao consultório, que ficava aos fundos. Leandro Boldrini não estava. O médico, de acordo com a polícia, chegou logo depois. Passou rapidamente pela recepção e quando chegou ao consultório, se surpreendeu com a presença da mulher.

Ao Fantástico, a então secretária da clínica, Andressa Wagner, disse o que teria acontecido depois. “Deu questão de, não sei te dizer se foi segundos ou minutos, daí ele logo saiu porta afora, pedindo socorro: ‘Chama a polícia, homicídio, suicídio’. Falou assim. Aí, quando ele estava saindo assim, deu o estouro. Daí eu corri lá dentro logo para ver o que era. Ela já estava no chão”, relatou ela, que disse não ter percebido nenhuma discussão entre os dois.

A mesma delegada que acusa Leandro Boldrini de ser o mandante do assassinato do filho Bernardo foi a responsável pela investigação da morte de Odilaine. “Todas as provas levaram a crer que ela se matou. Ela falou isso no dia anterior para umas testemunhas, em um centro espírita, que ela ia se matar. Ela falou para empregada dela no dia que ela ia se matar”, conta a delegada Caroline Bamberg.

Perito contesta suicídio
Para tentar acabar com as dúvidas, a mãe de Odilaine resolveu contratar uma empresa de São Paulo que faz perícias particulares. Depois de analisar todo o processo, o perito criminal Sérgio Saldias, que nasceu no Chile, elaborou o laudo de 32 páginas.

Ele critica o fato de exames que considera importantes não terem sido realizados. Por exemplo: não houve perícia nas roupas de Odilaine, nem nas de Leandro Boldrini para identificar possíveis sinais de luta. Também não procuraram resíduos de pólvora nas mãos de Leandro, para confirmar que ele realmente não atirou.

O perito também contesta o laudo oficial que afirma só ter chumbo na mão esquerda de Odilaine, que era destra. Segundo Sérgio Saldias, o resultado teria que apontar “obrigatoriamente” pólvora nas duas mãos dela. A conclusão final do perito é que “não existem fundamentos científicos suficientes no processo para afirmar que Odilaine se suicidou”.

O diretor da empresa que fez a perícia levanta uma hipótese: fala que a mãe de Bernardo pode ter sido assassinada e não descarta a presença de uma terceira pessoa dentro do consultório. Ele acredita que Odilaine possa ter tentado se defender com a mão esquerda antes de levar o tiro. “Na hora de proteger ou de tentar tirar a arma de quem possivelmente colocou a arma na boca dela e efetuou o tiro, automaticamente ficaram resíduos só em uma mão dela”, ressalta Eduardo Llanos.

Em maio deste ano, o perito Douglas Piérola – que fez o laudo oficial atestando o suicídio de Odilaine – deu explicações ao Ministério Público. Para ele, a mão direita da enfermeira segurava o revólver. Para ter mais firmeza no tiro, ela teria usado a mão esquerda como apoio e assim, acabou cobrindo a direita. Isso explicaria o motivo de ter sido encontrado chumbo só na mão esquerda. Procurado, ele não quis se manifestar.

Os parentes de Odilaine pedem que a investigação seja reaberta. “Há a imperiosa necessidade de justiça, que seja reaberta essa investigação a fim de que a impunidade não seja alcançada”, afirma o advogado da mãe de Odilaine, Marlon Taborda.

A delegada não concorda. “Análise nova é uma coisa. Agora, fatos novos não têm. Eu não vou reabrir porque eu entendo que o inquérito está concluso, como deveria ser concluso: que realmente ela se matou”, afirma Caroline Bamberg. “Eu não posso ser movida por um clamor social, que quer que ele fique mais tempo preso por uma coisa que ele não cometeu”, acrescenta a delegada.

Os advogados de Leandro não quiseram se manifestar. Em 30 dias, a Justiça deve decidir se a morte de Odilaine vai ser investigada de novo ou não. “Tem que investigar. Eu não posso morrer com essa dúvida também. Nós perdemos as duas últimas joias da família, que era o Bernardo e Odilaine”, completa Jussara Uglione.

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