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domingo, 5 de outubro de 2014

'Fiquei 4 dias sem comida', desabafa transexual que ficou presa no Egito



Um dia após desembarcar na Itália, a transexual gaúcha Jhenifer Dalbosco, 28 anos, presa no Egito no início do mês passado por suspeita de prostituição, ainda se recupera da experiência vivida no país africano. Acompanhada de outra transexual brasileira que também havia sido presa e pesando cerca de 10 kg a menos, a jovem diz que precisou tomar remédios para poder relaxar após a prisão. Desde 4 de setembro, quando foi detida em um hotel no Cairo, dormia no chão do corredor de uma penitenciária de El Dokki. Ela foi solta na quarta-feira (1º).

"Foi horrível. Fiquei quatro dias sem comida, só com água. Voltei só com a roupa do corpo. Estou me recuperando de tudo", desabafou aoG1 nesta sexta-feira (3).

Hospedada na casa de uma amiga, Jhenifer voltou a se alimentar e a repousar em uma cama. "Elas chegaram fisicamente e psicologicamente abaladas, e eu dei alguns calmantes para elas poderem descansar. É uma história bem longa e muito sofrida, algo inacreditável. Eu só acreditei porque vi o estado em que as duas apareceram", relatou a amiga Nicole Robalo Ourique, 31 anos, também transexual, que vive na Itália com o marido.

Agora, ela se defende da acusação de prostituição, que no Egito é crime com pena prevista de um a três anos. “Não tinha prova nenhuma contra mim. Eu fui para fazer uma cirurgia no olho. Tenho um e-mail que comprova isso, que a gente não ia se prostituir”, garantiu.

Em 4 de setembro, Jhenifer desembarcou no Cairo, onde, segundo ela, realizaria uma cirurgia para a troca da cor do olho. Horas depois, no entanto, ela diz que foi detida quando dormia em um quarto de hotel da capital egípcia. Uma amiga, também transexual, estava no quarto ao lado e foi presa da mesma forma.

"Invadiram nosso hotel. Levaram tudo da gente. Foi horrível. Olhavam para nossa cara, riam. A gente não fala árabe, tampouco inglês. Mas sabia que estavam fazendo gracinhas conosco", recordou.
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As humilhações não se limitaram a xingamentos, segundo ela. "Eles batiam nossa cabeça uma na outra. Estou com algumas hematomas", descreveu.

No dia seguinte, foram levadas a uma penitenciária. Porém, conforme ela, não foram encaminhadas a uma cela. "Tinha uma cela feminina e duas masculinas. E um corredor entre elas. A gente ficou nesse corredor. Sem banheiro, sem cama, dormindo no chão. Não tinha comida, só tinha água", contou.

De dentro da prisão, Jhenifer não tinha notícias sobre seu processo de soltura e não entrou em contato com familiares ou amigos. "Me senti esquecida".

Da Itália, a amiga Nicole, ao saber do desaparecimento das duas brasileiras, recorreu ao consulado brasileiro. Sem ajuda, entretanto, contratou um advogado e pediu apoio ao consulado italiano para obter a liberdade das duas.

"O consulado brasileiro apareceu depois que procurei a Ouvidoria do Itamaraty e insisti muito. São coisas indignantes", disse Nicole.

Jhenifer ainda não tem planos de voltar ao Brasil. "Com todos esses gastos, seria impossível viajar agora", afirmou ela, que mantém contato com familiares e amigos de Porto Alegre.

O Ministério das Relações Exteriores informou que as duas transexuais receberam a mesma assistência consular a partir do dia em que Embaixada do Brasil no Cairo foi informada da detenção. "As autoridades egípcias não haviam informado a embaixada, até aquela data (15 de setembro), da detenção de nacional brasileira. A embaixada reiterou à Chancelaria local que casos de brasileiros detidos no Egito devem ser reportados à embaixada com a rapidez possível, para a prestação da devida assistência consular. Trata-se de situação enfrentada, também, por detidos de outras nacionalidades", informou o Itamaraty por meio de nota assinada pela assessoria de imprensa.

O Itamaraty disse ainda que ofereceu alimentação para ambas e trabalhou no processo de soltura. "Tomou, em seguida, providências para disponibilização de alimentação diária e acompanhamento, pela embaixada, das audiências judiciais que resultaram, no dia 23 de setembro, na decisão de libertação sob pagamento de fiança, concretizada no dia 1º de outubro", afirmou, em nota oficial.

"Em momento algum queixou-se a nacional brasileira de que a embaixada não lhe disponibilizava quantidade adequada de alimentos. Esse auxílio específico foi-lhe proporcionado após haver reclamado da qualidade da alimentação na detenção. Carece de fundamento a afirmação de que não houve apoio consular adequado", concluiu o texto.

Atraso na soltura
Uma audiência na última terça-feira (23) havia decidido pela liberdade imediata, sob fiança, de Jhenifer, porém trâmites burocráticos impediram a soltura imediata da brasileira. O valor foi pago pela família e amigos da gaúcha, que poderá responder ao processo sem precisar permanecer no país africano. Entretanto, ela foi solta apenas na última quarta. (G1 RS)

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